Apaixonados pelo que fazem, vários diretores de cinema expõem seu amor pela sétima arte em seus próprios filmes. E nada mais apaixonante e eficiente do que falar do cinema usando sua própria linguagem. A exemplo disso, temos a excelente comédia romântica “A Rosa Púrpura do Cairo”, do ácido Woddy Allen, o sensível “Cinema Paradiso”, de Giuseppe Tornatore e o incrível “A Noite Americana”, do diretor francês François Truffaut.
Truffaut, já consagrado por seus filmes lançados nas décadas de 1950 e 1960 (“Os Incompreendidos” e “Jules e Jim”, por exemplo), se sobressai ainda mais com essa pequena pérola que lhe rendeu o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 1973. O filme narra a produção de um filme e suas complicações. Dentre elas, romances, traições e até morte. O que resulta em cenas hilárias que facilmente ocorreriam de fato.
No filme, Truffaut não se esconde atrás da ficção e se mostra como um convicto narcisista. E ele pode. Afinal, sabe como amarrar uma história e como fazer rir nas cenas mais esdrúxulas, não deixando as atuações caricatas e as cenas patéticas. Não esconde o amor pelo cinema e, ainda mais, exalta sua profissão através do filme. Aliás, o tal filme dentro do filme, “Je Vous Présente Pamela”, é também dirigido por ele, por meio de interpretação. Um amante do cinema em dobro.
O longa-metragem também retrata a difícil tarefa de dirigir um filme. Pois, como o cinema é uma arte essencialmente coletiva, o diretor tem de contar com a cooperação de pessoas frequentemente instáveis e excêntricas, que podem ter interesses totalmente díspares e vícios reprováveis, especialmente a vaidade e a ambição exacerbada. É possível que um dos atores morra durante as filmagens ou que uma atriz entre em crise histérica numa cena. Não importa o que acontecer, o diretor está lá para mediar a situação e finalizar sua obra, sua paixão. E isso está no filme muito bem ilustrado.
Talvez taxem o filme de didático, mas é inegável que há de maneira explícita durante toda a obra o amor do criador com sua criatura. Com toda essa tentativa de humanizar o cinema, de aproximá-lo da vida, sem deixar de exaltá-lo, François Truffaut deixa para a história uma obra que é uma ode ao cinema e, afinal, é o que o diretor faz com inegável propriedade. Inesquecível, “A Noite Americana” é daqueles filmes que fazem mesmo os mais excêntricos cinéfilos saírem da sessão ainda mais apaixonados pelo cinema do que ao entrar.
9/10